Antes de dizer que a resposta é sim, que uma universidade pública deve entregar seus produtos de graça, eu quero te mostrar que, na minha opinião, a resposta é não. E vou te dizer o porquê! 

Recentemente, atendi a um grupo de pesquisadores que desenvolveu um pó revelador para a área criminal. Assim, esse pó pode ser usado para identificação de digitais e de sangue, por exemplo.

O objetivo do grupo era levar o pó revelador ao mercado. Mas quem seriam os “clientes”? A polícia. Ou seja, esse tipo de tecnologia ia auxiliar muito a polícia brasileira. Hoje, ela importa materiais para a perícia. 

Esse grupo de pesquisa é de uma universidade pública. Assim, a ideia era criar uma startup para compartilhar a tecnologia. Dessa maneira seria possível vender para o Estado. 

Pense bem: a polícia já importa um produto similar com capacidade inferior. Então por que não comprar de uma universidade pública? Isso pode ajudar ela a investir mais em pesquisa. 

Portanto, esse é o motivo da resposta ser não. Uma instituição pública pode sim vender um produto para outra instituição pública. 

Pense em vacinas, por exemplo. Se alguma universidade pública desenvolve uma vacina, poderia vender ao Ministério da Saúde. 

O poder de compra do Estado é realmente grande. Dessa forma, precisamos pensar que ele pode atuar com outros agentes do Estado.

E por qual valor vender, então?

Quando falamos de vendas entre entes públicos, a negociação também entra no cenário. Sendo assim, os valores não têm padrão. Cada caso pode ser negociado de uma forma. O importante é que não seja de graça. 

Entretanto, uma universidade pública não precisa e nem deve virar fábrica. Seu objetivo não é vender. E sim investir em pesquisa de novas tecnologias.

Mas, se alguma tecnologia for desenvolvida internamente, por que não levar ao Estado?

Melhoria para a universidade pública e para a sociedade

Essa parceria de compra entre universidade pública e Estado é muito importante. O que fomenta a pesquisa e, consequentemente, ajuda a sociedade.

Quando inserimos uma tecnologia no Estado ou no setor produtivo, a sociedade também se beneficia. É o caso da vacina, novamente. A importância dela é fundamental. Portanto, se o Estado ganha, a sociedade também ganha. 

Em 2020, o orçamento destinado para pesquisa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) caiu 87%!

Dessa forma, pensar em outras maneiras de conseguir aumentar o investimento é importante. Assim, vender tecnologias produzidas por institutos de pesquisa pode ajudar. 

Ok, mas como realizar essa venda?

Como a venda será feita por uma universidade pública, ela não é realizada da mesma maneira que um comércio, por exemplo. Assim, ela é feita por licenciamento

Licenciar tecnologia é repassar a uma outra pessoa o direito de comercializar ou usar algo que é seu. 

Então temos dois caminhos: o da venda e o da utilização.

Licenciamento para a venda

Por exemplo, se o grupo de pesquisa que criou o pó revelador fizesse uma startup, ele poderia licenciar a tecnologia da universidade pública para a startup. Assim, poderia vender para outros clientes. Ou, também, para o Estado.

Mas, em troca, a startup precisaria realizar o pagamento de royalties para a universidade. Entretanto, a quantidade de royalties a serem pagos não é fixa. A empresa pode pagar o que for combinado entre ela e a instituição. Pode ser 5%, 10%, 15%, não importa. Cada caso é um caso. 

Licenciamento para utilização

É possível, também, realizar o licenciamento direto para a utilização da tecnologia. Sendo assim, no caso de uma vacina, ela pode ser repassada para o Estado por meio de um valor específico. Esse valor também negociado entre as duas entidades. Que pode ser pago em royalties ou não. 

Portanto, a resposta da pergunta inicial é não!

Parece complexo, né? Mas quando pensamos melhor e analisamos o caso, vemos que o melhor cenário é esse. Quando possibilitamos o desenvolvimento de tecnologias do público para o público. 

Isso é benéfico tanto para o Estado quanto para as instituições de pesquisa. Além de ser importante para a sociedade. 

Ressalto que investir em pesquisa é fundamental para que isso ocorra. E se o Estado não está conseguindo ou não quer alcançar esse patamar, que os licenciamentos ajudem.