Vivo num ambiente de promoção do empreendedorismo inovador e atuo com gestão da inovação. No meu dia a dia borbulha startup e uma série de programas dão apoio a elas. Só que ainda vejo algumas percepções equivocadas sobre o tema. Na minha visão, é preciso entender a startup em suas particularidades, não podemos simplesmente colocá-las em caixinhas. É importante um olhar atento a modalidade de cada negócio. Detalho o pensamento:
A caixinha da Escala
Quando avaliamos startups, avaliamos a premissa de escala do negócio, ou seja, quanto mais clientes a startup conseguir com o mínimo de estrutura, melhor é a escala dela. E aí, temos a primeira caixinha. Não podemos e não devemos colocar as startups de hardware, biotecnologia e TI na mesma caixinha.
A escala de um software é fácil de se mensurar, mas a de uma empresa de hardware ou biotecnologia é diferente. Nos dois últimos casos, temos insumos, sazonalidades, muitos equipamentos e muito conhecimento técnico. A escala será diferente. Isso não quer dizer que empresas de biotecnologia ou de hardware não devam ser mensuradas em sua escalabilidade, não, não é isso.
O que quero dizer é que não podemos padronizar a mesma régua de escala de uma startup de TI para uma startup de biotecnologia ou hardware, é preciso mensurar de forma diferente.
A caixinha da Propriedade Intelectual
Nesse caso a lógica inverte. Empresas de hardware e biotecnologia conseguem, se possuem um produto inovador, patentear a solução. Empresas de software não conseguem.
E não porque não querem, mas porque no Brasil não existe patente para software, a modalidade de proteção é o direito autoral por meio do registro de programa de computador. Daí, se a gente avalia a startup como tendo a propriedade intelectual como barreira de entrada, a empresa de software vai sempre sair em desvantagem. Esse critério precisa ser adequado a cada situação.
A caixinha do fluxo financeiro
Aqui é um ponto extremamente complicado. Empresas de TI conseguem ter uma estrutura enxuta de pessoal e infraestrutura. Muitas startups de TI começaram numa garagem, num quarto e hoje estão ganhando o mundo. O custo inicial é o computador, o programador e uma infra mínima.
Uma empresa de hardware já não consegue começar no quarto, tem que ser no mínimo uma garagem, ter o técnico de montagem das placas, comprar os componente etc. Assim, o custo aumenta de forma considerável.
Agora quando se fala de uma startup de biotecnologia, o custo é muito maior. Nem garagem, nem quarto é preciso um laboratório com autorização da Anvisa, insumos, equipamentos, vidraria, técnicos etc. É uma outra ordem de grandeza. Daí, ressalto que não se deve ter a mesma régua, a perspectiva é diferente.
A caixinha do marco regulatório
Empresas de TI, geralmente, não precisam de autorização para operar (mas depende claro, do modelo de negócio). Já as de hardware precisam, em alguns casos, de cadastrar o equipamento em órgãos como da Anatel. E as empresas de biotecnologia precisam de todas as autorizações possíveis, que vão desde a Anvisa, Vigilância Sanitária passando pelo Ministério da Agricultura, em alguns casos. No item marco regulário, a caixinha não devia nem existir, porque não podemos de forma alguma comparar.
A caixinha do tempo de resultado
Startup de software pode estar no mundo todo em 2 meses, em 6 meses, depende da escalabilidade e da proposta de valor. Se é biotecnologia pode estar localmente em 2 anos, isso porque há testes, ajustes, análises laboratoriais, ou seja, uma infinidade de condicionantes. As startups de hardware podem dar certo após um ano, depende muito do equipamento ir a campo, funcionar, testar, analisar e validar. Geralmente são feitos vários protótipos até que se chegue a uma versão pronta para a comercialização. Isso é normal. Então, não é possível querer o mesmo tempo de desenvolvimento entre elas. Não é questão de querer, não se trata de má vontade do empreendedor, mas sim do ritmo da tecnologia e da aceitação do mercado.
Diante dessas perspectivas é preciso entender as startups em suas particularidades, cada modelo de negócio deve ser analisado de forma única. É preciso sim ter critérios, mas eles devem se adequar ao modelo de negócio que está se apresentando. Se atuamos com startup, não podemos fazer diferente.